Sindroma de DTNM

Em certas alturas a minha apuradíssima consciência do mundo exterior faz-me ter noção de certas coisas que à maioria das pessoas passarão despercebidas. Naturalmente, essa consciência não se revela sempre, e o facto de muitas vezes as pessoas estarem a falar comigo e eu estar num transe profundo e não ouvir nada do que me dizem não é para aqui chamado.

Mas, dizia eu, apercebi-me ao longo dos tempos da existência de um seita composta por pessoas que têm, usando uma expressão do Markl, "demasiado tempo nas mãos". São pessoas que se dedicam a uma série de pequenas actividades diárias que vão, aos poucos, minando a sanidade mental das outras pessoas, e esperam assim em poucos anos vir a conquistar o mundo. Ou, pelo menos, a levar algumas pessoas a internamentos de urgência sob o efeito de drogas, amordaçados e presos em camisas de forças. São vitórias mais pequenas, mas o sucesso também se faz destas pequenas batalhas.

Há, por exemplo, o senhor - que ainda não consegui ver, tal é a rapidez com que actua - que se dedica a, todos os dias, esperar que eu estacione ao fundo da rua para tirar o carro que está precisamente em frente à minha porta. Saliente-se o timing perfeito que é necessário para esperar que eu abrande em frente à minha casa, solte alguns impropérios, e depois correr para o carro e sair da rua enquanto eu estou a estacionar.

Depois há o tipo que vive atrás da máquina de chocolates da minha faculdade e que ocupa os seus dias a carregar nos botões da máquina, para quando as pessoas lá chegarem porem o dinheiro e cair logo o último chocolate que lhes apetecia naquele momento (eu diria "o único chocolate da máquina de que não gostam", mas nunca me caiu um Dove, tenho tido sorte), antes de terem hipótese de escolha. Volto a salientar o trabalho de investigação que isto implica, para poderem saber qual o chocolate que a pessoa vai pedir, para não correrem o risco de ouvir a frase trágica "que sorte, era mesmo este!".

Enfim... os exemplos são às dezenas. Como a senhora que insiste em telefonar para a pessoa que está sentada atrás de mim no cinema. Ou o gajo à minha frente na fila do McDonald's que resolve pedir "queria um daqueles com carne de vaca. O que é que leva? Hmm... não sei. E o de peixe, o que tem? E aquele é de frango, é? Estou a ver. E as batatas, quantas vêm, assim mais ou menos em média por pacote?" (este último é especialmente eficaz quando estou em jejum desde o jantar do dia anterior). Coisas assim.

Sinto que estão a conspirar contra mim.

Eco! Eco!

Ricardo confessa que ouviu uma voz a segredar-lhe para tirar as luvas. "Estava com má recepção, por isso durante os primeiros penalties julguei que tinha de comprar uvas. Depois percebi".

O guardião prosseguiu, com outras revelações: "Os meus psiquiatras dizem para não prestar atenção às vozes, mas os extraterrestres que me implantaram o chip tinham avisado que ainda iam dar jeito."




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